sexta-feira, 15 de maio de 2015

NOS TRILHOS DO FUTEBOL AMADOR






Era uma manhã de domingo, chuvosa em Jundiaí, na década de 70. O palco, Associação Primavera de Esportes. Mais um jogo do campeonato amador da nossa cidade.
Estrela da Ponte x Panificadora Palma.
E havia também outro clube interessado no resultado. O 1º de Maio da Vila Progresso. A equipe do Palma já tinha a classificação garantida, além de ter um bom time. Ao Estrela somente a vitória interessava. O jogo estava marcado para as 8h00, com tolerância de 15 minutos.
Pois bem, após muito sacrifício e telefonemas, era feriado prolongado em Jundiaí, o Estrela conseguiu reunir apenas 10 jogadores, contando comigo que estava contundido e não iria jogar. Mais o técnico Ênio, o massagista Cidão, o roupeiro Baby e o sempre Estrela Zé Pretinho.
Praticamente impossível de ganhar o jogo!
Era mais ou menos 7h45, e já estávamos no vestiário, a chuva aumentara. Ninguém falava nada, o desanimo era total, mais uma vez quase eliminados da fase decisiva do campeonato. Mas eis que Zé Pretinho, que já havia feito uma parada no bar, pede a palavra. -"Só tem um jeito. Não deixar o time deles entrar em campo a tempo."
Explicação; a equipe do Palma era muito organizada, seus jogadores chegavam ao campo sempre juntos em duas peruas Kombi. Tudo certinho! Os vestiários do campo do Primavera eram dois, subterrâneos, e havia somente uma porta de ferro para cada um.
E o Zé Pretinho conclui o plano, diga-se de passagem sensacional! -"Eu vou lá com o Zelador buscar a chave do vestiário deles e deixa o resto prá mim. Quero ver aonde eles vão se trocar".
Nosso técnico, Ênio, emendou. -"Então vamos acelerar".
Acho que nunca uma equipe se trocou tão rápido. Em cinco minutos, batíamos bola no gramado, e as fichas de inscrição já estavam nas mãos do representante da Liga Jundiaiense.
Eis que aparece nos portões do estádio as duas conduções dos atletas do Palma, e um diretor foi rapidamente buscar a chave do vestiário deles.
-"Já entreguei, já levaram para baixo(vestiário)", disse o zelador do campo. Deu para ver o desespero dos jogadores, correria para todo lado, pois estavam atrasados (já passava das 8h00). O maior desespero mesmo! Alguns sem entender nada tentaram pular o alambrado, mas o Zelador impediu. Foram ao almoxarifado, tentar encontrar a cópia da chave. Em vão.
Por outro lado, tranquilo no balcão do bar, estava Zé Pretinho, orgulhoso do dever cumprido, e junto com o Pato, tomava mais uma JAPI. Para comemorar.
No adversário a correria e o desespero aumentavam e alguns atletas já estavam uniformizados e continuavam tentando pular o alambrado.
Foi quando nosso técnico dirigiu-se educadamente ao árbitro Bastião, cumprimentando-o e segurando a mão esquerda dele disse.
 -"Bastião, no seu relógio são 8h15, e o tempo está esgotado. Os caras vão ter que aprender cumprir horário. Vamos tomar chuva até quando? Acaba logo com isso!"
O árbitro Bastião que ainda ouvia os apelos dos diretores adversários, ainda do lado de fora, não teve dúvidas. "Vamos cumprir o regulamento." Pegou a bola, colocou no círculo central, conferiu o posicionamento da nossa equipe e apitou autorizando a saída e, o final da partida. Resultado: Estrela 1 x 0 (W.O. da equipe do Palma).
Os jogadores, técnico e diretores ficaram inconformados, simplesmente não acreditando no que viam. Afinal eles vieram com 18 atletas.
O pior viria depois. Alguns torcedores e diretores do 1º de Maio, interessados no resultado, mais inconformados ainda, diziam -"Palhaçada. Só podia ser o pessoal do Estrela mesmo, filhos da p... vão se f..., agora fomos desclassificados. Mas não vai ficar assim, amanhã vamos com advogado na liga." O presidente do 1º de Maio era o saudoso e guerreiro Toninho Tedesco, que mais tarde seria, em 1984, técnico do Estrela. Como presidente ele tomou a frente e imediatamente foi até o zelador perguntar para quem ele tinha entregado as chaves. O Zelador não teve dúvidas.
-"Entreguei para um magrinho de bigode que fica sempre no bar."
O Baby, nosso roupeiro, devolveu educadamente a chave do Estrela, e disse; -"Essa é do Estrela e a deles eu juro que não sei."
Mais tarde a outra chave seria jogada no rio, perto da fábrica Pozzani /Ponte São João, onde acho que esteja até hoje. Ninguém nunca mais viu.
Na segunda feira à noite, reunião fervendo na liga, confusão total. O Advogado do 1º de Maio levou como testemunha o zelador do campo que não teve dúvidas. -"Entreguei as duas chaves para a mesma pessoa, que era do Estrela. Havia também a xérox do livro como prova. E as assinaturas de quem recebeu as chaves eram exatamente iguais. Detalhe comprometedor, o Zé Pretinho, que já havia tomado algumas, esqueceu de mudar.
Resultado final do Departamento técnico da liga: Estrela desclassificado da fase seguinte. A vaga ficou com a equipe do 1º de Maio.
Mas o Estrela ficou mais uma vez na história, que por muito tempo foi comentada na cidade. "ERA A CHAVE DA VITÓRIA"



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