sexta-feira, 26 de março de 2010

NOS TRILHOS DO FUTEBOL AMADOR






Era uma manhã de domingo, chuvosa em Jundiaí, na década de 70. O palco, Associação Primavera de Esportes. Mais um jogo do campeonato amador da nossa cidade.
Estrela da Ponte x Panificadora Palma.
E havia também outro clube interessado no resultado. O 1º de Maio da Vila Progresso. A equipe do Palma já tinha a classificação garantida, além de ter um bom time. Ao Estrela somente a vitória interessava. O jogo estava marcado para as 8h00, com tolerância de 15 minutos.
Pois bem, após muito sacrifício e telefonemas, era feriado prolongado em Jundiaí, o Estrela conseguiu reunir apenas 10 jogadores, contando comigo que estava contundido e não iria jogar. Mais o técnico Ênio, o massagista Cidão, o roupeiro Baby e o sempre Estrela Zé Pretinho. Praticamente impossível de ganhar o jogo!
Era mais ou menos 7h45, e já estávamos no vestiário, pois a chuva aumentara. Ninguém falava nada, o desanimo era total, mais uma vez quase eliminados da fase decisiva do campeonato. Mas eis que Zé Pretinho, que já havia feito uma parada no bar, pede a palavra. -"Só tem um jeito. Não deixar o time deles entrar em campo a tempo."
Explicação; a equipe do Palma era muito organizada, seus jogadores chegavam ao campo sempre juntos em duas peruas Kombi. Tudo certinho! Os vestiários do campo do Primavera eram dois, subterrâneos, e havia somente uma porta de ferro para cada um.
E o Zé Pretinho conclui o plano, diga-se de passagem sensacional! -"Eu vou lá com o Zelador buscar a chave do vestiário deles e deixa o resto prá mim. Quero ver aonde eles vão se trocar".
Nosso técnico, Ênio, emendou. -"Então vamos acelerar". Acho que nunca uma equipe se trocou tão rápido. Em cinco minutos, batíamos bola no gramado, e as fichas de inscrição já estavam nas mãos do representante da Liga Jundiaiense.
Eis que aparece nos portões do estádio as duas conduções dos atletas do Palma, e um diretor foi rapidamente buscar a chave do vestiário deles. -"Já entreguei, já levaram para baixo(vestiário)", disse o zelador do campo. Deu para ver o desespero dos jogadores, correria para todo lado, pois estavam atrasados (já passava das 8h00). O maior desespero mesmo! Alguns sem entender nada tentaram pular o alambrado, mas o Zelador impediu. Foram ao almoxarifado, tentar encontrar a cópia da chave. Mas foi em vão.
Por outro lado, tranquilo no balcão do bar, estava Zé Pretinho, orgulhoso do dever cumprido, e junto com o Pato, tomava mais uma japi. Para comemorar. Para o adversário a correria e o desespero aumentavam e alguns atletas já estavam uniformizados e continuavam tentando pular o alambrado.
Foi quando nosso técnico dirigiu-se educadamente ao árbitro Bastião, cumprimentando-o e segurando a mão esquerda dele disse. -"Bastião, no seu relógio são 8h15, e o tempo está esgotado. Os caras vão ter que aprender cumprir horário. Vamos tomar chuva até quando? Acaba logo com isso!" O árbitro Bastião que ainda ouvia os apelos dos diretores adversários, ainda do lado de fora, não teve dúvidas. "Vamos cumprir o regulamento." Pegou a bola, colocou no círculo central, conferiu o posicionamento da nossa equipe e apitou autorizando a saída e, o final da partida. Resultado: Estrela 1 x 0 (W.O. da equipe do Palma).
Os jogadores, técnico e diretores ficaram inconformados, simplesmente não acreditando no que viam. Afinal eles vieram com 18 atletas.
O pior viria depois. Alguns torcedores e diretores do 1º de Maio, interessados no resultado, mais inconformados ainda, diziam -"Palhaçada. Só podia ser o pessoal do Estrela mesmo, filhos da p... vão se f..., agora fomos desclassificados. Mas não vai ficar assim, amanhã vamos com advogado na liga." O presidente do 1º de maio era o saudoso e guerreiro Toninho Tedesco, que mais tarde seria, em 1984, técnico do Estrela. Como presidente ele tomou a frente e imediatamente foi até o zelador perguntar para quem ele tinha entregado as chaves. O Zelador não teve dúvidas.
-"Entreguei para um magrinho de bigode que fica sempre no bar."
O Baby, nosso roupeiro, devolveu educadamente a chave do Estrela, e disse; -"Essa é do Estrela e a deles eu juro que não sei."
Mais tarde a outra chave seria jogada no rio, perto da fábrica Pozzani /Ponte São João, onde acho que esteja até hoje. Ninguém nunca mais viu.
Na segunda feira à noite, reunião fervendo na liga, confusão total. O Advogado do 1º de Maio levou como testemunha o zelador do campo que não teve dúvidas. -"Entreguei as duas chaves para a mesma pessoa, que era do Estrela. Havia também a xérox do livro como prova. E as assinaturas de quem recebeu as chaves eram exatamente iguais. Detalhe comprometedor, o Zé Pretinho, que já havia tomado algumas, esqueceu de mudar.
Resultado final do Departamento técnico da liga: Estrela desclassificado da fase seguinte. A vaga ficou com a equipe do 1º de Maio.
Mas o Estrela ficou mais uma vez na história, que por muito tempo foi comentada na cidade. "ERA A CHAVE DA VITÓRIA"



2 comentários:

Jaime Pomilio disse...

Mosele,

Muito divertidas tuas histórias sobre o futebol, verdadeiramente amador, de Jundiaí.
Conte sempre. Adoro tais histórias. Se souber inclua também do futebol profissional.

Mosele disse...

Olá Jaime, amigo e torcedor fanático do Galo. Imagino o que você está sofrendo. Mas agora acho que dá prá escapar outra vez da A-2. Ninguem merece. Fico feliz tambem por estar acompanhando nosso blog. Muito feliz mesmo. Vamos junto nessa. Histórias do profissional. Tem muitas. Lembra aquela das melancias atiradas no campo em Jaime Cintra no jogo Paulista e São Bento (eu acho) que jogava o Paraná no time deles.
Nosso centenário galo não é pouca coisa não. Um abração. Mosele.